Dezembro costuma ser um mês diferente.
Algumas pessoas ficam particularmente felizes, mas um grupo maior fica triste e outro ainda se sente profundamente deprimido. É o período do ano em que há maior incidência desse estado terrível, no qual as pessoas veem tudo negro, perdem as forças físicas e também as esperanças.
Esse sentimento pode ter várias causas. A mais comum é a sensação de desamparo e abandono que muitos experimentam.
Pessoas com a vida sentimental mal resolvida sentem até alguma inveja daqueles que vivem em família, ainda têm os pais vivos, inúmeros irmãos e primos. É claro que a inveja nem sempre está justificada, pois a maior parte daqueles que têm o convívio familiar mais estreito padece de inúmeras situações de rivalidade, disputa e conflito.
A sensação ainda pode se inverter, por exemplo, no período que antecede o carnaval. Nessa fase, as pessoas menos comprometidas com vínculos sólidos irão se divertir mais. Em dezembro todo o mundo quer estar casado; em fevereiro, solteiro!
Uma outra causa de depressão, típica desta época, tem a ver com a tendência de a maior parte das pessoas aproveitar a passagem do ano para fazer um balanço de suas vidas. Não deixa de ser razoável e útil pararmos, de tempos em tempos, para realizar uma revisão de como temos nos colocado diante dos desafios da existência.
Processo similar costuma ocorrer nos dias que antecedem o aniversário, especialmente aqueles que encerram mais uma década de existência. Fazer 30, 40, 50 ou 60 anos nos impõe uma auto-avaliação, cujo resultado nem sempre nos aparece como muito agradável.
Em dezembro, costumamos vivenciar a tristeza própria de não termos atingido todos os objetivos, de estarmos aquém dos nossos sonhos e expectativas. Mas a maior parte das pessoas faz esse balanço de vida de uma forma pouco criteriosa.
Muitas se deprimem mais do que deveriam, porque erram na “contabilidade emocional”. Por exemplo: se uma pessoa obesa fez, no início do ano, um projeto de perder 20 quilos durante 2013 e chega em dezembro com 10 quilos a menos, poderá ficar triste. Acredito que ela não tenha razões para isso.
Nossos sonhos e planos são as nossas metas: costumamos elaborá-los no início de cada período e a eles nos dedicarmos com algum afinco. Porém, raramente conseguimos realizá-los plenamente, porque nossa capacidade para imaginar será sempre maior do que a de realizar.
É o sonho que nos impulsiona. O importante é que tenhamos conseguido algum avanço, que tenhamos a sensação de que nossa vida evoluiu. As coisas que não foram atingidas continuarão na nossa agenda para o ano que virá, junto com nossas outras expectativas.
Triste mesmo é quando as pessoas constatam que, ano após ano, estão no mesmo lugar. E vejam bem: estou me referindo muito menos aos projetos práticos e materiais do que aos avanços íntimos e espirituais.
Às vezes, penso que o grande sentido da vida é conseguirmos sair da Terra, 70 ou 80 anos depois de termos chegado, um pouco mais bem resolvidos interiormente. É termos sido competentes para dominar nossas disposições agressivas, aprendido a lidar melhor com frustrações e dores de todo tipo, desenvolvido a persistência, nos tornado mais corajosos para fazer com que nossos sonhos se realizem. Enfim, é termos sido capazes de ter olhado interiormente, a ponto de nos tornarmos mais independentes do julgamento das outras pessoas.
E, nesse setor da vida interior, os avanços são muito lentos e difíceis. Qualquer progresso mínimo já deve ser motivo de grande alegria e de sonoras comemorações.
Desejo a todos vocês que, em dezembro de 2014, estejam com o coração cheio de orgulho e de contentamento pelo que puderam fazer por si mesmos e pelos outros no ano que irá começar.
Não há dinheiro ou coisa material que se iguale, em termos de satisfação, a esse tipo de sensação interior!
Fonte: Flávio Gikovate, Médico-psiquiatra, psicoterapeuta, conferencista e escritor. Atualmente apresentando o programa “No Divã do Gikovate”, na rádio CBN, e dedicando a maior parte do tempo à clínica.
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