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Férias do Yoga?: O que isso quer dizer? O que nos faz querer parar?

Por Ana Paula Malagueta Gondim para Portal Yoga.org

Pense na pergunta acima. Qual seria a sua resposta? Você já sentiu necessidade de "tirar férias" do Yoga? Se a resposta for positiva, porquê? Comecei a refletir sobre isso depois de ter ouvido mais de um aluno dizendo que “tinha tirado férias do Yoga”.

O que isso quer dizer? O que nos faz querer parar? Eu tenho algumas teorias, três delas são: o medo do autoconhecimento, ansiedade x expectativa e falta de foco x kali yuga. Entretanto, há um erro crucial permeando todos esses três – a dificuldade na constância.

Vivemos em uma época negra aonde encontramos muito mais dificuldade em nos manter conectados com Deus. Como se o Ego estivesse muito mais resistente. O Yoga é um dos principais meios de desestruturar o complexo ego-personalidade, com intuito de nos reestruturar em nossa verdadeira essência.

Estamos desconectados de nós mesmos, da natureza e dos outros, e mergulhar em nosso interior assusta, causa medo, apreensão e ansiedade. Fora isso, o fator que mais complica uma imersão tranquila e sólida ao Yoga é a agilidade das informações e respostas em nossa sociedade moderna e informatizada. Sofremos tantos estímulos que é praticamente como se nadassemos contra a maré, e conseguir manter o foco se torna mais difícil, assim como a constância. A facilidade com que nos desinteressamos das coisas é enorme.

Nos mantemos fiéis enquanto é prazeroso e interessante, mas quando os perrengues começam a aparecer, pulamos fora rapidamente. Mudamos de parceiros, tomamos um remédio para mascarar a dor ou trocamos o que já se tornou velho pela próxima novidade tecnológica e compacta. Por que então o mesmo não aconteceria com o Yoga? Por que resistiríamos à tentação de fugir quando os podres começam a aflorar e a transformação bate a sua porta, querendo acontecer?

O Yoga como um emaranhado de técnicas e ensinamentos transformam o serhumano e o elevam além da vida condicionada e repetitiva dessa encarnação. Não será fácil, mas também será muitas vezes prazeroso, e com certeza, será a decisão mais preciosa da sua vida. Escolher se conhecer e crescer espiritualmente é o que nos diferencia dos outros animais. Lembre-se da máxima dos sofistas gregos: Conhece-te a ti mesmo!

Retomemos a ideia inicial, aquela intenção de tirar umas férias – a vital necessidade de parar e repousar da maratona que é o sádhana diário. Pode ser realmente exaustivo descondicionar-se, desapegar-se e reeducar a nossa mente e padrões mentais. Esse cansaço é um ponto impor importantíssimo da prática e na vida do praticante. Um dos muitos obstáculos a serem enfrentados se há a real vontade de moksha.

Quais obstáculos seriam esses? Os kleshas, aspectos dolorosos do psiquismo. Vamos refletir um pouco sobre esse tema à luz de uma das escrituras mais importantes, a Bhagavad Gita: “Devido aos kleshas (instabilidades da mente), o progresso daqueles que Me vêem na Forma Imanifesta (Brahman), certamente, é muito penoso para os que estão corporificados, e com muitas dificuldades Me alcançam”.

No Yoga Sutra, 2.3, Patañjali os enumera da seguinte maneira: “Avidya, ignorância, asmita, egoísmo, raga, apego, dvesha, aversão, e abhinivesha, apego pela vida, são as aflições, kleshas”.

Para transcender os kleshas e o maior dos nossos obstáculos que é a ignorância primordial, avidya, é preciso muito mais do que posturas, exercícios respiratórios, kriyas, mantras ou meditação. É preciso querer isso. É preciso desejar realizar karma, a ação que neutraliza os kleshas.

É preciso criar coragem para largar. Largar o quê? O apego ao sofrimento e ao ego. O apego ao que já nos é conhecido e aceitar a luz que ilumina a escuridão. Aceitar o novo. A mudança. E acima de tudo ter confiança. Confiança em Isvahara.

Nem todas as experiências vividas no Yoga são agradáveis. Nem tudo que existe dentro de nós são apenas rosas. Mas considero tal espectrum excelente, como estímulos para crescer e nos alavancar além e para fora do ciclo de samsara, o infindável ciclo de vidas, mortes e renascimentos.

Imagine um gato remexendo em um lixão procurando algo para apreciar; é assim também a nossa prática. Remexemos no lixo do subconsciente na tentativa de purificar, transmutar “o ruim” em algo bom, até encontrarmos o caminho do meio, sattva, a plenitudade do nosso Ser, purnamadah. Onde tudo simplesmente é, sem qualidades e imortal.

Todo o nosso lixo mental e espiritual aflora conforme vamos nos movimentando em nosso espaço interno. Conforme saudamos ao Sol. Respiramos alternadamente. Cantamos Om. Oramos. Fazemos nauli. Nos concentramos. Meditamos. Ou nos silenciamos. Cada um com a sua história que se manifestará de inúmeras formas diferentes.

Os samskaras podem chegar à tona como náuseas, enjoo, tontura ou desconfortos durante um exercício de trataka, uma vontade de chorar, rir ou impaciência durante a permanência de um asana ou até mesmo vontade de gritar, correr, fugir ou se mexer, desnecessariamente durante um pranayama, shavasana ou meditação.

Escolhas. O autoconhecimento é repleto delas. Continuarei agarrado a esse padrão ou irei transcendê-lo? Vou tirar umas férias ou vou resolver isso agora? É nosso direito a escolha ou livre arbítrio. A todo momento estamos escolhendo entre o Ego e o Ser. Entre o sofrimento e o milagre. E, é muito comum não acreditarmos na nossa divindade e escolhermos a fuga. Preferimos seguir cegos a enxergar a nossa própria luz.

É preciso realmente muita coragem e tapas, mas também muita serenidade e confiança no yoga para ir em frente. Para continuar além e adentrar um território totalmente novo e desconhecido que é o nosso interior. Enquanto estamos juntos em cima do tapetinho praticando nossos asanas, respirando ritmadamente, cantando mantras e meditando juntos, tudo parece mais fácil, pois estamos sendo conduzidos e de uma certa maneira a sangha, o grupo, nos enche de coragem.

O professor e o guru nos enche de força e vontade, pois nos mostra tudo que nós já somos, o Ser, e que não há nada fora. É como se em cima do tapetinho com nosso professor e nossos coleguinhas nós fossemos capazes de tudo. Mas, quando é chegado o momento de fechar os olhos e enfrentar não só nosso paraíso interno como também nossos maiores infernos, a coisa muda de figura.

E não pense que estou me referindo só ao tempo passado em cima do mat, estou me referindo a todas as situações cotidianas. De quantas situações ou pessoas nós não fugimos, isolamos ou nos enraivamos? Quantas vezes não escolhemos evitar ao invés de encarar a nossa própria imagem no outro? Quantas vezes o aprendizado foi deixado para depois?

No entanto, é exatamente quando a respiração falha, o corpo treme, um ponto se enriqueje ou dói, as emoções afloram e o medo bate a sua porta é que devemos nos lembrar do motivo de estarmos ali e confiar nessa sabedoria milenar e saber que mesmo sozinhos, nunca estaremos solos nessas descobertas.

Ela pode parecer assustadora a princípio e podemos até nos acovardar, mas não ansiamos tanto pela mudança? Pelo primeiro vislumbre de transformação? É neste ponto, quando um samskara ou um vasana é associonado, que devemos assumir a nossa responsabilidade individual pela nossa mudança. É nós que escolhemos mudar e essa mudança só virá de dentro. Ou nas palavras de Gandhi, “Seja a transformação que deseja ver no mundo.”

O professor só pode ir até um certo ponto ao aluno. Ele não pode praticar por você, mas sim apontar o caminho. É como uma peregrinação. Você foi instruído do caminho, mas deve trilhá-lo sozinho. Sempre estaremos sob a instrução de um professor, um guru ou do nosso mestre interior.

Mas, infelizmente, nos esquecemos disso, e passamos grande parte do tempo ensurdecidos e emudecidos pelos nossos pensamentos e dramas pessoais, e não olhamos para onde e o quê nos foi indicado.

Esquecemos que muitos já trilharam esse mesmo caminho, e temos exemplos maravilhosos de outros tantos que chegaram ao destino final. Krishna, Buda, Jesus, Ammaji...entre outros. Mas, escolhemos nos desesperar e acreditar na Voz do ego, ao invés da voz dos seres iluminados ou de nossos professores. Voltamos outra vez as escolhas.

Precisamos nos lembrar mais e esquecer menos, um professor disse certa vez. Lembrar que o Chamado à verdade está sempre presente, e que quando um professor fala devemos ouvir, quando lemos um texto, também devemos ouvir, e especialmente, quando nos silenciamos, devemos ouvir com ainda mais atenção.

E questionar e discernir as informações e buscar a real Verdade, que está acima da minha verdade pessoal, da sua, do grupo e de todo. Busquemos ouvir a Voz que tem estado nos chamando de volta à casa, à nossa morada interior.

Penso que quando nos sentimos amedontrados e sozinhos na jornada é importante respirar fundo e perceber que a ideia da separação é apenas mais um obstáculo em nosso caminho. É apenas uma distração, e poderosa. É excencial que se continue praticando independente da certeza de acertar ou errar, ou da ideia de vencer ou chegar. O que importa para o yoga é a jornada que trilhamos separados, mas sempre juntos.

Lembre-se, somos parte do mesmo Ser. Saiba que quando decidimos dar o primeiro passo, os outros certamente virão, mesmo que incertos ou trêmulos. Saiba que muitos caminham com você e na mesma direção. Saiba que os desafios virão, e acredite, nunca serão mais do que você possa aguentar. Tudo vem na medida certa e na hora ideal ao nosso crescimento. Aprenda a aceitar todos os presentes que a vida lhe dão.

A sensação de estarmos tateando no escuro ou defronte o incerto é apenas passageira e ilusória. Precisamos abrir os olhos e buscar a plenitude na certeza que vem de uma respiração consciente e conectada, ou então da prática de posturas que centralizem e equilibrem a energia, e acima de tudo, precisamos lembrar de mantrar e cantar os nomes de Deus, não importa o nome que damos a ele.

Devemos sempre nos conectar com a consciência divina. Precisamos de momentos de silêncio em nosso dia a dia para acalmar as vozes da nossa mente e as perturbações externas, senão nunca haverá espaço interno para sua luz interior crescer. Precisamos criar espaço interno para a transformação acontecer.

Não permita que uma simples fagulha obscurecida, uma corda que pareça uma cobra no escuro ou uma pequena poeira no espelho do seu Ser, obstrua a luz da sua alma. Não duvide – ela nunca se apaga! Lembre-se que fomos criados na paz e que é essa e para esta que iremos retornar sempre que quisermos. Não há nada que a luz do Ser não possa clarear.

O Yoga é a nossa chave de volta para casa. É o caminho da lembrança de quem já somos – a paz e a plenitude. Criados na paz e de paz. Todo o resto é apenas invenção do Ego. O resto é maya, ilusão, e nunca poderá destruir o que é imutável e eterno.

O yoga é nosso suporte e nossa escolha de vida. A escolha de ver a Verdade e de sermos a Verdade em nossas vidas e relacionamentos. Cultivemos discernimento. Respeito para com nós e aos demais e com o mundo que nos acolhe. Servir sem olhar a quem. Amar e só amar. Buscar e alcançar o meio que une os pedaços.

A fração que virá a ser completa. O nada que virará o tudo. Sempre unidos. Sempre juntos. Aprendendo juntos e trabalham juntos em benefício da humanidade. Que despertemos. Que cantemos o Om e que esse nos lembre quem nós somos para que assim possamos viver em paz.

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